Saúde

A Chéquia pressiona pela coordenação da UE no armazenamento de medicamentos e oferece um modelo resiliente para o futuro

Num esforço para prevenir a escassez de medicamentos em toda a Europa, a Chéquia defende uma abordagem mais coordenada à constituição de reservas de medicamentos.

O Vice-Ministro da Saúde checo, Jakub Dvořáček, enfatizou a necessidade de um sistema que equilibre os interesses nacionais com a solidariedade europeia, especialmente porque alguns países – como a Alemanha – tomaram medidas que podem afectar a disponibilidade de medicamentos em toda a UE.

“Não estamos a dizer que a Alemanha está errada, mas a forma como gerem os seus arsenais está a criar consequências não intencionais para outros países da UE”, disse Dvořáček à Diário da Feira. Ele referia-se aos requisitos de armazenamento de seis meses que a Alemanha impõe às empresas farmacêuticas.

Armazenagem nacional versus solidariedade europeia

A questão das reservas nacionais tem sido debatida na UE há vários meses. Tal como relatou a Diário da Feira, a Chéquia, com uma coligação de outros Estados-Membros da UE, alertou que a acumulação excessiva de reservas poderia prejudicar o mercado único.

A Medicines for Europe, a associação que representa o setor europeu de genéricos e biossimilares, alertou em abril de 2024 que a acumulação descoordenada poderia ter consequências indesejadas, incluindo custos adicionais para os fabricantes, ou a incapacidade de transferir as existências de um estado da UE para outro para mitigar potenciais escassezes.

A Chéquia também tem falado abertamente sobre potenciais desvantagens.

Para os Estados-Membros mais pequenos da UE, como a Chéquia, o risco é que os países maiores que armazenam medicamentos possam deixar outros sem abastecimentos essenciais. “Na Europa, os medicamentos são armazenados, mas ninguém sabe o que está armazenado e em que quantidades. Não existe um ponto central onde esta informação é recolhida”, explicou Dvořáček.

Ele citou novamente a Alemanha como o principal exemplo de como as reservas nacionais podem perturbar o equilíbrio. De acordo com a lei alemã, as empresas farmacêuticas devem manter um stock de medicamentos para seis meses no âmbito de determinados concursos.

Chéquia oferece nova abordagem

A Chéquia está a tentar oferecer uma alternativa – um sistema dinâmico que possa servir de modelo para o resto da UE.

“Desenvolvemos um sistema em que não armazenamos medicamentos, mas estabelecemos um sistema de reservas que nos permite aceder aos fornecimentos conforme necessário”, disse Dvořáček. A Autoridade Estatal Checa de Reservas de Materiais (SSHR) opera este sistema através de concursos para distribuidores que detêm stocks de medicamentos, garantindo que os fornecimentos podem ser atualizados e renovados regularmente para evitar desperdícios.

“Os medicamentos não são propriedade do Estado ou do SSHR, o que significa que podemos reagir rapidamente se houver escassez”, observou Dvořáček. “Se um fabricante reportar interrupção no fornecimento, podemos solicitar redução de reservas, cobrindo a lacuna sem que pacientes ou farmácias percebam qualquer diferença.”

Este sistema, explicou, foi concebido para ser flexível e evitar o excesso de stocks ou o prazo de validade dos medicamentos. “Não precisamos de esperar por uma catástrofe para utilizar estes medicamentos”, disse ele, acrescentando: “A chave é evitar o pânico que muitas vezes surge com as discussões sobre a acumulação de stocks”.

Na opinião de Dvořáček, a UE necessita de uma visão clara dos esquemas de constituição de reservas em curso e de recolher informações sobre quem armazena o quê e em que quantidades. Defende a criação de um sistema dinâmico à escala da UE, baseado no modelo de reservas checo, onde os medicamentos não sejam propriedade central, mas possam ser rapidamente mobilizados e reabastecidos.

“Se toda a Europa detém um grande abastecimento de penicilina, por exemplo, não faz sentido porque nunca precisaremos deste medicamento em quantidades tão grandes. Precisamos de pensar em como distribuir o stock para que seja realmente utilizável quando for necessário”, explicou Dvořáček.

A questão do armazenamento é discutida no âmbito da Critical Medicines Alliance (CMA), criada pela Autoridade de Preparação e Resposta a Emergências Sanitárias (HERA). A CMA reúne os Estados-Membros da UE, a indústria e a sociedade civil para enfrentar os desafios da escassez de medicamentos e das vulnerabilidades da cadeia de abastecimento.

Espera-se que a CMA forneça recomendações até ao final do ano sobre a forma como a UE deve abordar o armazenamento e a produção de medicamentos essenciais.

Estas recomendações poderiam ser integradas na planeada Lei dos Medicamentos Críticos, a ser proposta pela nova Comissão Europeia.

Vistas otimistas

A Lei de Medicamentos Críticos pretende abordar mais do que apenas o armazenamento. Incluirá também apoio à produção, aquisição e distribuição em toda a UE.

“Os últimos anos mostraram-nos quão frágeis são as nossas cadeias de abastecimento. Não se trata apenas de estocar; trata-se de garantir que a Europa tenha capacidade de produção e flexibilidade para responder às crises”, afirmou.

A iniciativa checa obteve amplo apoio entre os estados membros da UE.

“Temos visto muita vontade de outros países para colaborar neste processo”, disse Dvořáček, observando que mesmo a Alemanha, que foi inicialmente destacada pelas suas práticas de constituição de reservas, tem estado aberta a ajustar a sua abordagem à luz de uma estratégia europeia mais ampla.

Olhando para o futuro, Dvořáček continua optimista de que a Europa poderá encontrar um caminho a seguir que equilibre as necessidades nacionais com a solidariedade europeia. Ele vê o sistema checo como um modelo potencial para outros.

“O que estamos a fazer na Chéquia pode ser transferível para outros países. Dá flexibilidade, evita desperdícios e garante que os medicamentos estejam disponíveis quando e onde são mais necessários”, observou.