Os cuidados oncológicos na Europa enfrentam desafios críticos, incluindo ineficiências, disparidades no acesso e foco insuficiente em abordagens centradas no paciente que priorizem as experiências e perspectivas do paciente.
São necessárias novas estratégias para integrar medidas de resultados relatados pelos pacientes (PROMs) e medidas de experiência relatadas pelos pacientes (PREMs) nos sistemas de saúde.
“Vários indicadores mostram grandes disparidades na prevenção e nos cuidados do cancro entre e dentro dos Estados-Membros da UE – no acesso a programas de prevenção, nas taxas de deteção precoce do cancro, no tratamento e na sobrevivência. Compreender melhor o que está por trás e como lidar com essas disparidades é imperativo para melhorar a saúde dos europeus”, disse à Diário da Feira Caroline Berchet, economista de saúde doutorada na Divisão de Saúde da OCDE.
O Guia de Ação All.Can para Tratamento Eficiente do Câncer enfatiza o uso de Medidas de Resultados Relatados pelo Paciente (PROMs) e Medidas de Experiência Relatadas pelo Paciente (PREMs) como uma forma eficaz de enfrentar esses desafios.
Estas ferramentas têm o potencial de melhorar os cuidados oncológicos através de um melhor alinhamento com as necessidades e preferências das pessoas, promovendo a colaboração entre pacientes e prestadores de cuidados de saúde.
O Guia de Ação All.Can
O Guia de Ação All.Can para Tratamento Eficiente do Câncer, desenvolvido em colaboração com a Universidade de Amsterdã, fornece um roteiro abrangente para melhorar a eficiência do tratamento do câncer em todos os sistemas de saúde. Enfatiza a prestação de cuidados oncológicos mais rápidos, mais coordenados, equitativos e centrados no paciente em toda a Europa.
“O objetivo é simples, mas profundamente impactante: colocar o paciente no centro dos cuidados”, observou Ana Sofia Carvalho, MD MScPH, doutoranda na Amsterdam UMC e investigadora principal do All.Can Action Guide, refletindo sobre o impacto transformador do PROMs e PREMs.
“Essas medidas garantem que o atendimento que prestamos esteja alinhado com o que é mais importante para as pessoas que o recebem.”
O papel dos PROMs e PREMs na eficiência
Os PROMs avaliam os resultados de saúde do ponto de vista do paciente, capturando seu bem-estar físico e emocional. Em contraste, os PREMs avaliam as experiências dos pacientes, concentrando-se em dimensões como comunicação, coordenação e acesso aos cuidados.
“Não se trata de esperar que o médico diga: ‘Seu exame está bom’. É sobre o paciente poder dizer: ‘Agora me sinto melhor e o atendimento atendeu às minhas necessidades’”, explicou Carvalho. “Esta mudança de enfoque é fundamental para a construção de um sistema de saúde que sirva verdadeiramente a sua população.”
A coleta e análise sistemáticas dessas métricas podem identificar ineficiências, melhorar a prestação de cuidados e aumentar a segurança do paciente. Também abrem caminho para a tomada de decisões partilhadas, o que não só capacita os pacientes, mas também reduz a ansiedade relacionada com o tratamento.
Histórias de sucesso: Inglaterra e Suíça
A integração de PROMs e PREMs já está a produzir resultados em Inglaterra e na Suíça. A Pesquisa Nacional de Experiência do Paciente com Câncer da Inglaterra (NCPES) tem sido uma pedra angular do tratamento do câncer centrado no paciente desde 2010. Ela fornece dados abrangentes sobre experiências de tratamento, orientando melhorias em todo o Serviço Nacional de Saúde (NHS).
Na Suíça, os inquéritos SCAPE (Swiss Cancer Patient Experiences) oferecem um exemplo convincente de inovação num sistema de saúde descentralizado. A iniciativa começou em quatro hospitais em 2018 e desde então expandiu-se para 21 centros oncológicos em todo o país, abrangendo regiões de língua francesa, alemã e italiana.
“SCAPE é uma história de sucesso”, compartilhou Carvalho. “É uma prova do poder de uma equipe pequena, focada e com objetivos claros. Eles adaptaram as ferramentas desenvolvidas na Inglaterra, garantindo relevância cultural e linguística para os pacientes suíços, envolvendo o público e os pacientes em todo o processo.”
No entanto, os desafios permanecem. “O maior obstáculo é a sustentabilidade”, observou o pesquisador. “É necessário financiamento consistente para continuar e expandir esses esforços.”
Superando barreiras à implementação
Apesar da promessa dos PROMs e PREMs, a implementação não está isenta de obstáculos.
A normalização é um obstáculo crítico, uma vez que os sistemas de saúde variam muito em toda a Europa. A vontade política e o financiamento são igualmente cruciais, como sublinhado pelo projecto SCAPE.
“Na Suíça, aprendemos que um dos maiores desafios era adaptar as ferramentas à população multilingue e culturalmente diversificada”, explicou Carvalho. “Mas envolver pacientes e prestadores de cuidados desde o início garantiu que os inquéritos fossem significativos e acionáveis”.
Os quadros jurídicos, a interoperabilidade dos sistemas de dados de saúde e a colaboração entre as partes interessadas são essenciais para ampliar estas iniciativas.
Os países devem também abordar as disparidades no acesso aos cuidados, garantindo que as populações vulneráveis não sejam deixadas para trás.
O caminho a seguir: recomendações para a Europa
O Guia de Ação All.Can descreve um caminho claro para a Europa aproveitar plenamente o potencial das medidas de resultados relatados pelos pacientes (PROMs) e das medidas de experiência relatadas pelos pacientes (PREMs).
Em primeiro lugar, o guia recomenda a adopção de instrumentos padronizados para recolher dados comunicados pelos pacientes de forma consistente em todas as regiões e instituições. Esta abordagem unificada garante que os dados sejam comparáveis e acionáveis em diferentes sistemas de saúde.
Em segundo lugar, sublinha a importância da integração dos dados comunicados pelos pacientes nos registos oncológicos. Ao incorporar PROMs e PREMs nestes registos, os profissionais de saúde e os decisores políticos podem aumentar a utilidade dos dados para uma tomada de decisão informada.
O guia também apela ao envolvimento activo dos pacientes na concepção e avaliação dos sistemas de cuidados. Envolver os pacientes e as suas comunidades neste processo garante que os sistemas de saúde respondem às suas necessidades e refletem com precisão as suas experiências.
Por último, o guia sublinha a necessidade de garantir financiamento sustentado. O apoio financeiro a longo prazo é fundamental para garantir a continuidade e a escalabilidade destas iniciativas, permitindo-lhes alcançar um impacto significativo ao longo do tempo.
“O objetivo final”, concluiu Carvalho, “não é apenas tratar o cancro, mas garantir que os cuidados prestados respondem eficazmente às necessidades das pessoas por ele afetadas. Essa é a promessa de um sistema de saúde centrado no paciente.”
Das métricas às mudanças significativas
Basicamente, o impulso para PROMs e PREMs é transformar dados em insights acionáveis. Estas ferramentas não são fins em si mesmas, mas meios para alcançar melhores resultados, maior equidade e um sistema de saúde mais humano.
“A recolha e análise regular de dados relatados pelos pacientes não é apenas um exercício técnico”, enfatizou Carvalho, “é uma questão de construir um sistema de saúde que ouça e aprenda com os seus pacientes”.
À medida que a Europa navega pelas complexidades dos cuidados oncológicos, a adoção de métricas centradas no paciente oferece um roteiro para o progresso. Ao alinhar os cuidados com as experiências e resultados dos pacientes, os prestadores de cuidados de saúde podem garantir que nenhum paciente seja deixado para trás na luta contra o cancro.
(Editado por Brian Maguire | Laboratório de Advocacia da Diário da Feira)